JÁ
NÃO ESCRAVOS, MAS IRMÃOS
1. No início dum novo ano, que acolhemos
como uma graça e um dom de Deus para a humanidade, desejo dirigir, a cada homem
e mulher, bem como a todos os povos e nações do mundo, aos chefes de Estado e
de Governo e aos responsáveis das várias religiões, os meus ardentes votos de
paz, que acompanho com a minha oração a fim de que cessem as guerras, os
conflitos e os inúmeros sofrimentos provocados quer pela mão do homem quer por
velhas e novas epidemias e pelos efeitos devastadores das calamidades naturais.
Rezo de modo particular para que, respondendo à nossa vocação comum de
colaborar com Deus e com todas as pessoas de boa vontade para a promoção da
concórdia e da paz no mundo, saibamos resistir à tentação de nos comportarmos
de forma não digna da nossa humanidade.
. O tema, que escolhi para esta mensagem,
inspira-se na Carta de São Paulo a Filêmon; nela, o Apóstolo pede ao seu
colaborador para acolher Onésimo, que antes era escravo do próprio Filêmon mas agora
tornou-se cristão, merecendo por isso mesmo, segundo Paulo, ser considerado um
irmão. Escreve o Apóstolo dos gentios: «Ele foi afastado por breve tempo, a fim
de que o recebas para sempre, não já como escravo, mas muito mais do que um
escravo, como irmão querido» (Fm 15-16). Tornando-se cristão, Onésimo passou a
ser irmão de Filêmon. Deste modo, a conversão a Cristo, o início duma vida de
discipulado em Cristo constitui um novo nascimento (cf. 2 Cor 5, 17; 1 Pd 1,
3), que regenera a fraternidade como vínculo fundante da vida familiar e
alicerce da vida social.
(...)
Penso
em tantos trabalhadores e trabalhadoras, mesmo menores, escravizados nos mais
diversos sectores, a nível formal e informal, desde o trabalho doméstico ao
trabalho agrícola, da indústria manufatureira à mineração, tanto nos países
onde a legislação do trabalho não está conforme às normas e padrões mínimos
internacionais, como – ainda que ilegalmente – naqueles cuja legislação protege
o trabalhador.
(...)
Penso
no «trabalho escravo».
Penso
nas pessoas obrigadas a prostituírem-se, entre as quais se contam muitos
menores, e nas escravas e escravos sexuais; nas mulheres forçadas a casar-se,
quer as que são vendidas para casamento quer as que são deixadas em sucessão a
um familiar por morte do marido, sem que tenham o direito de dar ou não o
próprio consentimento.
Não
posso deixar de pensar a quantos, menores e adultos, são objeto de tráfico e
comercialização para remoção de órgãos, para ser recrutados como soldados, para
servir de pedintes, para atividades ilegais como a produção ou venda de drogas,
ou para formas disfarçadas de adoção internacional.
Penso,
enfim, em todos aqueles que são raptados e mantidos em cativeiro por grupos
terroristas, servindo os seus objetivos como combatentes ou, especialmente no
que diz respeito às meninas e mulheres, como escravas sexuais. Muitos deles
desaparecem, alguns são vendidos várias vezes, torturados, mutilados ou mortos.
(...)
Globalizar a fraternidade, não a
escravidão nem a indiferença
Sabemos
que Deus perguntará a cada um de nós: Que fizeste do teu irmão? (cf. Gn 4,
9-10). A globalização da indiferença, que hoje pesa sobre a vida de tantas
irmãs e de tantos irmãos, requer de todos nós que nos façamos artífices duma
globalização da solidariedade e da fraternidade que possa devolver-lhes a
esperança e levá-los a retomar, com coragem, o caminho através dos problemas do
nosso tempo e as novas perspectivas que este traz consigo e que Deus coloca nas
nossas mãos.
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