A visita de Bento XVI, em maio de 2007, deixou dois
grandes marcos na Igreja do Brasil: a canonização de Frei Galvão
em São Paulo
e a abertura da 5.ª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do
Caribe, em Aparecida.
Não houve o mesmo entusiasmo das três vindas de João
Paulo II, em 1980, 1991 e 1997, que percorreu 23 cidades do País, mas
o alemão Joseph Ratzinger, o papa hoje renunciante, também
emocionou os católicos brasileiros. Uma das cenas mais tocantes de sua agenda
foi o encontro com jovens dependentes de drogas, em tratamento na Fazenda
Esperança, em Guaratinguetá.
A reportagem é de José Maria Mayrink e publicada pelo
jornal O Estado de S. Paulo, 28-02-2013.
"Em Aparecida, Bento XVI fez um discurso
importante no qual traçou os rumos para a evangelização da América
Latina", disse o teólogo e historiador José Oscar Beozzo,
assessor de pastoral para as comunidades populares. Esperava-se uma guinada dos
bispos para uma linha mais conservadora no continente, mas o discurso do papa
apontou para outro rumo. Foi um documento inovador, apesar de alguns pontos
terem sido alterados, aparentemente por prelados da Cúria Romana, antes de ser
submetido à aprovação do Vaticano. As alterações atingiram principalmente
conceitos e diretrizes referentes às Comunidades Eclesiais de Base
(CEBs).
O relacionamento de Roma com o episcopado brasileiro foi afetuoso,
respeitoso e sem rusgas durante os sete anos e dez meses do governo de Bento
XVI. O episcopado, constituído à imagem dos dois últimos papas, que
nomearam a maioria de seus membros, submeteu-se com obediência e respeito às
orientações da Cúria Romana. Bento XVI nomeou 138 bispos, 24
arcebispos e 3 cardeais. A maioria de perfil bastante discreto, mas com algumas
revelações, como d. Joaquim Mol Guimarães, bispo auxiliar de
Belo Horizonte, e d. Edson Tasquetto Damian, bispo de São
Gabriel da Cachoeira (AM).
Não se criaram problemas para Roma, como nos tempos da Teologia
da Libertação, quando religiosos e leigos contestaram pontos antes
intocáveis da doutrina oficial e foram punidos pela insubordinação. Um dos
poucos incidentes foram as greves de fome de d. Luiz Flávio Cappio,
da Diocese de Barra (BA), em protesto contra as obras de transposição
do Rio São Francisco. Questões ligadas à violência e à disputa de
terras, que sempre envolveram a Igreja, continuaram gerando tensões. O bispo de
Xingu, d. Erwin Kräutler, ameaçado de morte, recebe proteção
da polícia 24 horas por dia.
Intransigência
O então cardeal Ratzinger, que dirigiu por mais de 20
anos a Congregação para a Doutrina da Fé e foi o responsável pela condenação do
teólogo Leonardo Boff, pareceu menos intransigente quando se tornou papa. Só
aparência, pois não fez concessões em relação a questões morais contestadas por
católicos brasileiros. A Igreja manteve o veto ao aborto, à inseminação
artificial, ao uso de contraceptivos e à união de pessoas do mesmo sexo, sempre
com o argumento de que se trata da defesa de valores da humanidade e não apenas
de princípios religiosos do catolicismo.
O papa sofreu com a resistência a essa doutrina, porque muitos fiéis
desprezaram a palavra dele para seguir suas próprias. Casais divorciados que
partiram para uma segunda união costumam comungar nas missas, apesar de serem
proibidos de participar dos sacramentos.
A queda da porcentagem de católicos - que caiu de 74% em 2000 para 65%
em 2010 - foi outra preocupação para Bento XVI. Embora seus
fiéis continuem sendo maioria em números absolutos, esse quadro exige uma
reflexão dos bispos, que se perguntam onde a pastoral está errando. O cardeal
d. Cláudio Hummes, ex-arcebispo de São Paulo e prefeito
emérito da Congregação para o Clero, identifica falhas na evangelização e
sugere como solução um grande esforço pastoral para reconquistar batizados que
abandonaram a Igreja.
Situações opostas
Os templos estão cada vez mais vazios nas grandes cidades, mas a prática
religiosa é animadora nas pequenas comunidades. O bispo de Mogi das Cruzes, d. Pedro
Luiz Stringhini, está animado com sua diocese, que abrange dez
municípios, cinco deles na Grande São Paulo. "Itaquaquecetuba,
o mais pobre, é aquele onde as comunidades parecem mais entusiasmadas",
disse. Até dezembro de 2012, ele dirigia a Diocese de Franca
(SP), onde a situação era semelhante.
A Igreja registrou vários casos de denúncias de pedofilia e abusos
sexuais praticados por sacerdotes, o mais recente divulgado na segunda-feira na
Arquidiocese de Niterói (RJ).
São ocorrências quase pontuais, mas nem por isso menos vergonhosas. D. Pedro
Luiz, que enfrentou um desses escândalos no clero de Franca,
disse que, em 2010, a
CNBB aprovou diretrizes para a formação e acompanhamento de seminaristas e
padres. Fez isso por ordem de Bento XVI, que foi apertando o
cerco até decretar, em janeiro deste ano, "tolerância zero" com a
pedofilia.
Fonte: IHU On-Line
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