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sábado, 1 de maio de 2010

Eucaristia - Mistério de Fé - Dom José F. Falcão


Mistério da fé. Assim é denominada pela Igreja a Eucaristia. O vocábulo mistério evoca principalmente a ideia de profundidade e de obscuridade.

A Eucaristia é mistério de fé, porque este Pão não é, apenas, o símbolo da presença do Senhor entre os seus, por sua mensagem e por sua graça. Este Pão é Cristo, como Ele próprio afirmou “O pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo” (cf Jo 6,51). Não é um argumento humano que nos leva a aceitar esta presença do Senhor no pão eucarístico, mas somente a fé.

E porque Ele está presente realmente na Eucaristia, quem dela se alimenta já superou a morte. Já traz em si garantia da sua vida que não passa. Porque quem come a sua carne e bebe o seu sangue tem a vida eterna (cf Jo 6, 54). Palavras duras para quem não tem fé, mas fonte de vida para o cristão que se dá, até o fim, pela construção de um mundo de amor e solidariedade, de unidade e de paz.

Porque este Pão foi instituído para ser rompido, partilhado e comido pela criatura humana. E ao chegar às mãos do discípulo de Jesus como alimento, nutre-o na difícil tarefa de construir um mundo em que todos se sintam irmãos. Porque é o pão da vida descido do céu. Ao longo de três anos de pregação do Reino de Deus, Jesus preparou os seus apóstolos para este mistério da fé. Um dia, multiplicou os pães para saciar a fome do seu povo. E essa fração do pão já era o anúncio da Eucaristia. Na véspera de sua Paixão, o gesto é repetido. Toma o pão, dá graças, parte-o e diz: “Isto é meu corpo que é dado por vós. Fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19). Depois de ressuscitado, quando caía a tarde e o dia chegava ao fi m, sentado à mesa, Ele toma outra vez o pão, recita uma bênção, o parte e partilha. E os discípulos de Emaús enxergam nele o Senhor. Hoje também este pão é rompido e dado aos discípulos. E no gesto de parti-lo, eles descobrem nesse pão a presença de seu Senhor e Mestre.

Este pão é dividido e distribuído para que os discípulos de Jesus - de todos os povos e raças - se reconheçam como irmãos. E sejam construtores de um mundo fraterno, em que o pão material, o pão do saber e o pão da solidariedade sejam repartidos com todos. Porque quem come a sua carne e bebe o seu sangue permanece nele e viverá por ele (Jo 6, 56 e 57). E sua vida é amor. Viver nele e dele é viver em fraternidade. Daí as palavras de São Paulo: “Já que há um só pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, visto que todos participamos desse único pão” (1 Cor 10,17). Alimentando-nos do pão eucarístico, unimo-nos estreitamente a ele e por ele aos nossos irmãos. E seremos, na terra, construtores da família fraterna dos Filhos de Deus.

Não serão vãs estas palavras no mundo em que vivemos? Mundo dilacerado pelo ódio, por lutas fratricidas, por profundas desigualdades sociais? Sim, se lhe faltar o testemunho heróico de cristãos, que não temem servir os outros até o sacrifício de sua vida. Cristãos que se alimentam do “pão da vida”. Alimento dos discípulos do Senhor, comprometidos com a transformação profunda das estruturas da sociedade para torná-las condizentes com as exigências do Evangelho. Cristãos que não se dobram ao mal que há na terra. Porque têm consciência de que a Eucaristia não é o refugio dos fracos, de um misticismo alienante, mas o vigor dos construtores de uma sociedade que seja a do prenúncio, embora longínquo, do mundo que há de vir.

*Cardeal José Freire Falcão
Arcebispo Emérito de Brasília

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